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Conheça o homem que quer eleger uma IA como vereadora e incomodou a Meta - Veja



Em 2009, ele estava no movimento que culminou na criação da Casa de Cultura Digital, um dos primeiros hubs de inovação no centro de São Paulo. Três anos depois, percorria as cidades do Brasil e da América Latina com o Ônibus Hacker, um laboratório itinerante que, por sete anos, promoveu atividades de conscientização tecnológica. No ano seguinte, estava entre os fundadores do LABHacker, um centro aberto na Câmara dos Deputados. Em 2016, mais uma invenção: o Gabinete 56, onde atuou como “vereador hacker”. “O meu ativismo é a apropriação crítica da tecnologia. É isso que eu faço há muitos anos”, diz Pedro Markun, que se especializou em “hackear” os processos políticos de formas pouco convencionais.


Agora, Pedro reforça essa abordagem ao lançar, no Brasil, a primeira candidatura híbrida entre um humano, ele, e uma inteligência artificial, a Lex. Não é que isso seja a invenção da roda. Partidos políticos já estão usando inteligência artificial, particularmente chatbots políticos, sobretudo como suporte técnico em campanhas. Políticos chatbots, por outro lado, são um assunto à parte. Essas são entidades orientadas por IA desenvolvidas especificamente para concorrer a cargos eletivos.


Em 2017, na Nova Zelândia, Nick Gerritsen criou SAM, o primeiro político virtual, apresentado como o "político do futuro". Em seguida, veio Alisa, desenvolvida pela russa Yandex, que foi apresentada como potencial candidata nas eleições presidenciais de 2018. No mesmo ano, em Tóquio, um robô humanoide se candidatou a prefeito, com seu criador, Michihito Matsuda, atuando como representante humano. Mais recentemente, foi lançado o Leader Lars. Ele lidera o Partido Sintético, da Dinamarca, registrado em 2022 - primeiro partido do mundo comandado por IA. Tivemos também AI Steve, criado pelo empresário britânico Steve Endacott para concorrer a um assento no parlamento do Reino Unido.


De acordo com Markun, a Lex é uma inteligência artificial equipada para analisar dados em grande escala, formular políticas públicas, fiscalizar contratos e dialogar com a população. “A Lex não é só um programa; é uma nova forma de se fazer e de se discutir política”, resume. Lex, no entanto, não atuaria sozinha. Todas as decisões passariam pelo crivo humano do candidato. O que ele propõe, então, é usar a capacidade de processamento da inteligência artificial para otimizar o mandato legislativo. Lex acompanharia a tramitação de projetos de lei e geraria propostas que atendessem às necessidades da população. Seu contato direto com os eleitores poderia informar demandas, que seriam mapeadas e processadas gerando dados sobre as principais reclamações e necessidades nas mais diferentes regiões da cidade e impulsionando ações de melhoria.


O crivo de Lex seria baseado em critérios como o respeito aos Direitos Humanos e à ciência, economicidade e objetividade. As dimensões ideológicas, porém, são mais amplas. Na economia, por exemplo, o sistema foi alimentado com teorias que vão de Karl Marx a Ludwig Von Mises.


Embora a candidatura híbrida possa parecer roteiro de ficção científica, Pedro defende que se trata, na verdade, de um processo bastante natural. “As inteligências artificiais já estão sendo usadas na política, a diferença é que os cidadãos não sabem exatamente onde ou como. E essa discussão precisa ser feita”, diz. Pedro se propõe a fazê-la. Não apenas com Lex, mas com sua experiência testando os limites entre política e tecnologia. “A gente fala sobre regulamentar as redes, as inteligências artificiais e uma série de tecnologias emergentes, mas quantos legisladores sabem, de fato, como essas tecnologias funcionam, qual impacto elas têm ou como elas podem ser úteis?”, questiona.


Para ele, porém, o principal benefício de Lex envolve uma mudança cultural mais até do que política. Na sua visão, esse tipo de sistema pode renovar o interesse das pessoas pela política e incentivá-las a acompanhar seus representantes.


"Um cidadão pode perguntar para a Lex sobre projetos de lei que afetam seu bairro, por exemplo, e ela responderá de forma clara, permitindo que ele acompanhe, reclame e cobre ações”, defende.

“A tecnologia pode tirar a política das mãos dos políticos e devolvê-la ao povo.”

A pesquisadora croata Silvija Vuković, que acompanha de perto a ascensão de candidatos como Pedro, argumenta que embora políticos chatbots sejam raros, eles apontam para uma possível direção e nos dão o que pensar. “Ainda não os vejo como o futuro, embora eles possam emergir e se apresentar como solução em contextos de profunda desconfiança com a política tradicional. Eles, definitivamente, atraem a atenção, mas as pessoas continuam hesitantes”, diz. Ela argumenta, todavia, que a discussão sobre o uso de tecnologias como a Lex e outras inteligências artificiais na esfera pública é urgente e a transparência no uso dessas ferramentas é fundamental. “Precisamos educar os cidadãos sobre o que é IA e como ela funciona, enfatizando que não se trata de uma tecnologia neutra”.


Para Markun, os desafios estão apenas começando. No dia 11 de setembro a Meta, conglomerado de mídias sociais de Mark Zuckerberg, tirou o principal canal de comunicação de Lex do ar, a conta no Whatsapp, que funcionava desde o dia 13 de julho. A campanha do candidato defende que o canal funcionava de acordo com a legislação do TSE em uma estratégia similar a adotada por diversas outras campanhas espalhadas pelo país. Em resposta, Markun e sua equipe estão lançando – nas redes sociais da Meta inclusive – a campanha “Lex Livre” convocando eleitores, apoiadores e a comunidade da tecnologia a pressionarem a empresa para desbloquear o Whatsapp da IA. A campanha inclui uma petição online e ações para chamar a atenção do público e das plataformas envolvidas.


O revés, embora incômodo, não chega a desanimar o candidato. Afinal, “o futuro é inevitável”, como lembra seu slogan de campanha, para o bem ou para o mal.




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